Monday, January 22, 2007
india song 6 (onan em goa)
Palolem beach, 17:15
Acho que apanhei uma insolacao nas pernas. Estou a senti-las a ferver. Esqueci-me de por creme nas pernas e tenho estado a tarde toda no alpendre da "cabana junto a praia" (qual tema de Jose Cid) a ler ao Sol. Adivinha-se uma bela noite. Olha, antes isso de disenteria (como o pobre do Joni que esta a desfazer-se ha 3 dias).
Palolem beach: lembra-me duas coisas, a serie "A praia da China" e o filme a “The Beach". Agua quente mas nao translucida (areia nao clara), um palmeiral selvagem a nossa frente, uma grande baia, uma ilha selvagem no lado direito da baia (quando se esta virado para o mar) e dezenas de pequenos "resorts" com beach shacks ao longo da mesma. Paradisiaco. O tempo aqui parece que para. Estamos num paraiso freak, apesar de ser ate para o caro dentro dos padroes indianos. Mas, mesmo assim, ainda nao esta estragado pela prospeccao turistica. Ainda se mantem tudo semitosco e depois esta praia resolve tudo pela beleza imponente que tem.
Quando vinha do cabanal, para o cyber onde agora estou e que fica tambem muito proximo da praia, descobri uma formula infalivel para nao ser interpelado pelos pescadores e angariadores que estao constantemente a querer levar-nos a fazer uma "boat trip to see the dolphins". Ate ja foi uma ter comigo a cabana a querer impingir-me uma para amanha. Ate foi a proposta mais barata de todas, andam a pedir 400 rupias por pessoa e ela pede 150. A ver vamos, eu gostava de ir mas temos de entrar em contencao de despesas. Ja gastamos muito mais do que haviamos previsto. Parece ser tudo muito barato mas acaba por nao ser a pechincha que se apregoa sempre. Eles ja aprenderam muito bem a lidar com toda esta torrente de interessados pela tao especial India (tem decadas disso). Ha coisas em que a diferenca dos nossos precos ainda se mostra muito grande (na maioria das coisas) mas ha outras que nem por isso. Quer dizer... as coisas estao mais unifomizadas do que era suposto (ate pelo que fomos percebendo pelas indicacoes do Lonely Planet e outros guias). Mumbai, obviamente, sabiamos que era caro, e ate agora foi o sitio mais caro mas a diferenca (e isso foi o que surpreendeu) nos outros sitios nao parece ser assim tao grande. Mas Goa significa turismo (e ainda crescente), por isso nao choca que assim seja.
Momento muito bom da viagem: a viagem de comboio entre Mumbai e Goa (estacao de karmali). Este era um momento que eu aguardava com grande expectativa. Uma coisa com que sempre sonhei e que me comecou a crescer na cabeca desde o momento em que comecamos a alinhavar a viagem: andar de comboio na India, durante muitas horas, ver a India, entrar pela India adentro. Sobretudo porque, nos ultimos meses, sempre que entrava num comboio, no metro, num taxi, em Lisboa, a ultima coisa que me apetecia era que essa deslocacao acabasse. Tinha uma fome enorme de me deixar ir, de me deixar conduzir: tao farto, insatisfeito, entediado e exausto estava dos meus meus dias. Nessas alturas, a India surgia (como desde ha muito) como o refugio que eu criei na minha cabeca. O refugio dos dias melhores, aquele sitio, situacao, sentimento, sensacao ou cenario que fantasiamos e ao qual recorremos muitas vezes to save us from grief. Por isso, quando percebi, ha pouco mais de um mes, que tinha a possibilidade de vir a India essa foi logo a imagem que me apareceu na cabeca: finalmente vou andar de comboio na India, durante muitas horas, a ver a India, horas e horas a ver a India. nessa noite (na noite em que decidi fazer esta viagem) nao dormi.
A viagem de comboio comecou com um choque. Ao entrar no comboio fiquei em estado de choque (isto da India, primeiro estranha-se e depois entranha-se). Tinhamos comprado bilhetes Sleepers 3 AC. Quer isto dizer: deitados, 3 de cada lado, ar condicionado (a la indiana, claro). Pois, isto para mim, na minha efabuladora e pouco efectivamente viajada mente, era ter acesso a um vagao de camas, com compartimentos, etc. Mesmo que muito old school, era isso que eu esperava. Ate porque, a experiencia ate agora em termos de comboios, na viagem a Nashik, era positiva. Na viagem para la fomos sem ar condicionado e era mais precario mas no regresso, numa carruagem com ar condicionado, a viagem foi muito agradavel e a dita carruagem (dentro dos tramites indianos) era bastante confortavel. Pois que, o meu choque sucede quando entro na carruagem do comboio para Karmali e me deparo com o que parece uma estagnacao no tempo. As carruagens sleepers parecem ser o interior de um submarino russo durante a guerra fria. O choque nao vem da precariedade: vem da austeridade (nao consigo explicar isto muito bem), da massificacao, do muito pouco para muitos, da funcionalidade maxima com o minimo.
(Estou a perder a capacidade de articular frases, sinto que nada disto que escrevo acaba por ser suficientemente justo para expressar aquilo que vivo e quero transmitir. Falta-me imenso vocabulario em portugues, ja falo com os meus amigos em ingles. Quando escrevo, tenho imensas duvidas em algumas palavras. Que coisa tao parva e estranha. Ainda nao escrevi uma unica linha na agenda Moleskine (o tal caderno preto de capa dura, que acabou por nao ser assim tao dura) que comprei. Conclusao: so conseguirei talvez escrever a india depois da india).
Para concluir, a viagem de comboio foi muito especial, como eu esperava. A India foi acontecendo. Conforme as horas iam passando, 12 horas, note-se, para percorrer 654km, a India foi-se desenhando dentro da minha cabeca. A India que eu vim desenhando ao longo dos anos, dentro de mim, como um local fantastico, mitico, o refugio. A India desenhou-se e nao mostra ser um sitio mitico mas sim um sitio efectivo: feito de paisagens luxuriantes, de selva virgem, cursos de agua, cordilheiras, pessoas sempre, mesmo nos sitios mais inospitos e aparentemente desertos, povoacoes minimas e pauperrimas, uma luz sempre difusa e doce, o cheiro a lixo constante e que tambem nos parece doce, o cheiro das queimadas que se fazem para repelir os mosquitos, estacoes de comboio a cair de podres, outras mais intactas, outras bonitas, os carros e os rickshaws que tambem sao doces como o seu fumo que tambem acaba por ser doce. A India nao se mostra o sitio que sempre julguei mitico e cristalizado. India igual a doce-amargo. Bittersweet india. India igual a real, muito real. A India acontece-se muito e realmente.
Anteontem, quando vinhamos nas motas de Candolim para Panaji, no fim do dia, eu e o Miguel a cantar big hits da madonna, conclui que a India era bonita mas nao chegava a ser bela. Mas, logo ali, suspeitei que a minha conclusao nao se ficaria por ali. Hoje, fiz-lhe a errata, na minha cabeca, a India acaba por ser bela sem chegar a ser exactamente bonita.
E, com isto, assim, me vou; a ver se ainda consigo dar um mergulho antes de jantar.
(Nao revi nada do que escrevi, erros, dislexias, etc., serao muito possiveis, nao revi a pontuacao mas neste teclado isso seria impossivel)
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1 comment:
"A india acontece-se". Gostei muito. Quero mais. Bjs! Beli
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