ipodonan

Sunday, December 05, 2010

mais uma vez a escrita

debruço-me sobre variadas coisas. antes de mais, disse à xaninha que preferia ficar sozinho e que não queria que ela viesse dormir comigo. acho que fiz bem, fiz o que senti; ela disse que percebia e que ainda bem que o fiz. eu sei que: ainda bem que o fiz; seria incapaz de ter, neste momento, alguém a meu lado. preciso de estar-me.
enquanto vinha no táxi invadiu-me uma, até agora, nova sensação. a sensação da despedida. vi as ruas como se da última vez se tratasse; vi as ruas como se nunca mais as voltasse a ver. a morte está-me sempre muito presente (começo, inclusivamente, a ponderar se não serei obcecado por ela) e, há minutos atrás, senti-a tão em mim. é estranho isto mas tão, ao mesmo tempo, quase, familiar; sinto que a morte me acompanha (talvez por tanto nela pensar). sinto que está sempre a pairar sobre a minha cabeça. eu não quero morrer agora, juro, mas, quase, sinto que ela está em permanente diálogo comigo (gostaria de escrever melhor, e mais, sobre isto mas agora há outras prioridades).
saí do táxi, e, no seguimento da reflexão sobre a morte, ao estar a escrever-me, como sempre, fui dar à escrita e percebi: a escrita é a coisa mais avassaladora e pesada que pode a um ser acontecer. é de uma responsabilidade tremenda. passo a explicar: quando se escreve, quando se é escritor, ou escrevente, como diz o outro, e acho bem, essa terminologia, o escrever passa a ser uma imposição inegável. uma pessoa que escreve não pode deixar isso de lado, silenciado, esquecido, inoperante. é uma obrigação. é uma responsabilidade. escrever é, mesmo, uma responsabilidade. está a tocar-se, operar-se, mover-se num nível muito do "sublime". e a escrita exige que algo daí decorra. vou tentar explicar melhor: o escritor/escrevente sente mas há, dentro de si, algo que lhe diz: - manifesta, concretiza, instala, escreve. a escrita nada mais é do que INSTALAÇÃO. quem está na escrita, ao sentir, tem uma imediata responsabilidade de concretizar aquilo que lhe surge/ocorre: é sua função. o escritor é um mero médium. nada mais do que isso. é, mesmo. é uma peça de um jogo tão maior... é apenas um obreiro. e isto leva-me ao derrubar de todas as fantasias que teci sobre a grande virtude de ser um escritor. ser um escritor é virtude nenhuma; é uma função, opressiva, desgastante e redutora, como qualquer outra o é. é uma função. é claro que existe a, nem sei bem, agora definir, mas tentarei, questão da eloquência, gosto, forma, virtude, até, talento e dote, mas ser escritor é nada mais do que uma tarefa. há aqui uma coisa terrível (no mais amplo sentido, que engloba o sentimento de grande benção e, ao mesmo, ser um mero servo: rato na gaiola): a imperiosidade de escrever. eu dou por mim a querer poder sentir as minhas coisas por, e para, mim sem ter a "obrigação" de as registar. mas não consigo, não consigo mesmo. há algo dentro de mim, completamente anexo ao que sinto, que, automaticamente, me obriga a expressar o que me ocorre. eu sei que nem toda a escrita é desta forma, for god's sake, mas, em mim, na forma confessional e endógena, como a escrita me acontece, não pode deixar de ser desta forma. e é isso mesmo: não pode deixar de ser desta forma! isto é grande e arrebatador. às vezes gostava de ter uma mais leve missão. mas não posso, não consigo virar-lhe, à escrita, as costas. até porque há aqui algo a grandemente ressaltar: eu adoro o que escrevo. e "quem corre por gosto não cansa". sou tão mais feliz quando escrevo. é, de facto, uma benção. ao escrever sou tão mais. tenho é de deixar de ter medo daquilo que a escrita me trará. só pode ser bom. porque eu sou bem; e eu escrevo(-me) bem. eu sou do bem. escrevendo-me ou não!

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