ipodonan

Thursday, January 15, 2009

os filhos de hédon (talvez um futuro work in, future, progress)

Quem visita Hédon não visita um planeta, um continente, um país, uma cidade, uma vila, uma aldeia, um lugar, uma rua, uma casa, uma porta. Quem visita Hédon visita a energia de um coração extensível, cuja dimensão pode oscilar entre uma mera partícula e toda a incógnita capacidade espacial do universo. Quem visita Hédon pode estar a visitar-se. Sabemos que Hédon é habitado e que ocupa espaço mas não sabemos, prezado leitor, as suas reais e potenciais proporções. Muito menos sabemos nós, legião mais ou menos intrépida de narradores, a data precisa da sua fundação. Alguns de nós estão convictos de que Hédon não teve início e que jamais terá, porventura, um fim. Outros de nós há, talvez mais evoluídos ou que sustentam a vontade de o ser, que suspeitam de que Hédon tem uma existência intermitente e que tenderá a desaparecer. Esses, os supostamente mais evoluídos ou que sustentam a vontade de o ser, defendem que a extinção de Hédon se processará mediante a descoberta de uma cura porque, asseveram eles, Hédon é uma doença. Hédon, como qualquer outra entidade espacial, tem uma dinâmica própria; é habitado. E, assim sendo, todos os dias em Hédon se registam nascimentos, uniões, desuniões e mortes. Há quem nasça e morra em Hédon, há quem nunca lá viva, há quem apenas lá se una, ou desuna, e há quem apenas lá vá morrer. Há, contudo, em Hédon, uma presença forte da hereditariedade. Há uma palavra, um código, uma téssera que permite a entrada, permanência e saída de Hédon. Essa senha é igual para todos e não precisa de ser pronunciada. É uma senha sentida e chama-se: Espécie de Amor. Os dias em Hédon são, por norma, agitados e intensos; são dias ansiosos. Aliás, o ar que se respira em Hédon apresenta, na sua mais profunda composição, altas concentrações de ansiedade e, a existência e livre circulação desse mesmo elemento, é uma das razões porque viver em Hédon, mais do que uma imperativa condição, é um vício. Estamos nós, legião mais ou menos intrépida de narradores, certos, prezado leitor (e assumiremos o leitor como uma legião mais ou menos intrépida de seres que amam, uma massa plural e abstracta, o mundo), de que muitos de vós em Hédon se encontram viciados. O vício começa muito cedo; começa, muitas vezes, com o início da vida e é transmitido aos recém-chegados ao mundo pelas suas próprias mães. Recorde-se, prezado leitor, de que a questão da hereditariedade já foi por nós, legião mais ou menos intrépida de narradores, anteriormente enunciada. Essa questão fica, por ora, adiada; a sua peremptória e assertiva dissecação só poderá ocorrer mediante um concílio dentro da nossa própria legião e após selada a conclusão sobre a polémica questão: é ou não Hédon, além de um vício, uma doença? Falemos, então e agora, das noites em Hédon. Quando do céu o Sol se evade e a sua ausência, num dinâmico manto, a o seu próprio ritmo e vontade, da cor do sempre o firmamento torna, começa em Hédon a sentir-se o efeito dessa operação. Os sangues começam a apressar-se e existem zonas nos corpos que, quais magnetes transcendentais, imprimem à circulação do fluxo dessas substâncias, que, caso possam ser degustadas, das mesmas se dirá estarem carregadas de diversas e aleatórias ligas de diversos e aleatórios metais, uma velocidade por todos conhecida ou, pelo menos, sentida mas por nenhuns convenientemente explicada. As noites em Hédon não são apenas o fruto da voz e da fúria do sangue; são o dentro, o interior absoluto do sangue em si mesmo. Pedimos ao prezado leitor que, caso a sua paciência demonstre a vontade de fraquejar, se retraia e tente ultrapassar o facto de o nosso relato se revelar ziguezagueante. A hesitação faz parte de Hédon e a verdade é que, uma vez mais, deixaremos em suspenso a descrição de uma das suas faces para, em seu lugar, aprofundar a dissecação de outra. Nesse sentido, deixemos as noites por exaurir, numa outra ocasião, e passemos à caracterização, o mais afincada possível, do dia. O dia em Hédon nasce muitas vezes. Não será certo, ou recomendável, adiantar a quantidade de vezes que o dia em Hédon nasce. Porque em Hédon o dia não se afirma como um todo; é uma entidade pleomórfica, mutante e altamente contraditória. O dia desfaz-se, refaz-se e contrafaz-se; e todos esses processos em nada são previsíveis, sistemáticos ou classificáveis. Muito menos possível é, prezado leitor, assinalar as causas que esses fenómenos têm no seu determinar. Apenas os efeitos são detectáveis e sobre eles, por falta de vontade de o fazer mais tardiamente, focaremos agora a nossa narração. Há três espécies de efeitos que o dia em Hédon provoca: 1- a presença presente 2- a presença ausente 3- a fuga 1: A presença presente é um efeito imediatamente detectável, não somente pela força da redundância mas, sobretudo, pela assertividade da relação dialéctica entre aquilo que o dia emana/produz, a cogitação sobre essa produção e o discurso sobre essa cogitação (em análise última, sempre sobre a emanação/produção per si; sendo esta a única parcela que comporta irrefutável factualidade). Quando a presença é presente está constantemente a tentar estabelecer pontes, mais ou menos sólidas e bem fundamentadas, com a emanação/produção dos dias, a sua profunda verdade, o que a precedeu, a sua presente configuração e sobre o que a fará perdurar ou não (o teste tende a ser permanente). A presença presente tem como máximas intenções o aprisionamento do tempo e a certeza da solidez do espaço. A presença presente é hipercinética, altamente analítica, voraz, dinamizadora, eufórica, ferozmente ligada à ideia de verdade, instável, combativa, intensa, séria, convicta da sua própria clareza, arrebatada, amante, sedenta de espelhamento, de empatia, de entrega, de certezas, de profundidade, de perenidade, de inteligibilidade, de entendimento, de discurso, de amor; no fundo, sedenta de presença. É esta presença que faz com que o amor seja a matéria transversal da arte, porque é ela, a presença presente, apesar de tudo e por amor, a própria vontade da arte. (a desenvolver posteriormente) 2: A presença ausente é, com efeito, um efeito cuja dificuldade na sua detecção se alimenta a si mesma. A presença ausente nunca deixa de ser presente mas essa presença não é imediatamente classificável; usa o tempo e o espaço de uma forma que é irregular e que está em permanente digestão desse mesmo uso. Pode dizer-se que, com frequência, ao caminhar sobre a areia, esta presença, nesta não deixa as suas pegadas; isto porque o que para si assume é que se encontra a caminhar sobre água.

1 comment:

Ana Coke said...

Continuas genial... «ler-te» é sempre um prazer.

Beijo grande*