ipodonan

Saturday, February 18, 2006

um recado, um splinter, uma recomendação, um retrato, um desejo

deve dar gozo ouvir-te falar, de facto, deve dar um grande gozo. eu não o sei porque já não te ouço. não te ouço nem te vejo mas pressinto que deve dar um grande gozo ouvir-te falar. sei que o teria, ao gozo, se pudesse ouvir-te falar. a falar com propriedade. tu e a tua propriedade ao falar. deve dar-te um grande gozo toda essa tua propriedade. cheguei agora à conclusão que o tiveste primeiro, ao gozo, antes mesmo de te dignares a ter essa tão própria propriedade de falar. própria só para ti. a tua propriedade ao falar não é tua, nunca o foi. tentas tanto ser tão próprio na tua propriedade que te esqueces de ter propriedade em seres tu mesmo. tu mesmo, muito além da propriedade e da propriedade do discurso que tu julgas ser tão próprio. não te ouço na tua tão "própria" propriedade mas sei que dizes nada. dizes nada de jeito. mas dizes com jeito nada de jeito, é por isso que pareces tão próprio e com tanta propriedade no meio dessa tão evidente parecença com aquilo que pensas ter propriedade de ser. és coisa nenhuma. és o meu gozo e o teu discurso.
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sou antes ou depois da pele?
diz-me!
sou o contra-tacto, de facto, fel?
quis-me!
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fui ontem ver o espectáculo novo da lúcia sigalho ("sobreviver"). gostei muito. muito bonito, eficaz, poético, certo.
aconteceu-me uma coisa raríssima: enquanto estava a ver o espectáculo senti-me verdadeiramente surpreendido com o mesmo. com as direcções para onde este me levava. e a verdadeira surpresa ocorreu quando percebi que o mesmo (espectáculo/capacidade da lúcia enquanto criadora) me estava a proporcionar imagens e sensações que eu percebi que irei guardar comigo durante muito tempo. o espectáculo inscreve-se no futuro. no futuro de nós. é uma monstruosa capacidade essa. os meus parabéns à lúcia e a todos os que com ela estão a fazer aquele surpreendente espectáculo. e eu nem sou um incondicional sigalhista, de todo. mas quando há qualidade e superioridade tem de se situar as mesmas, de cabeça e mãos abertas.
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era uma vez um menino que sentia barcos a navegarem-lhe dentro do corpo. isso fazia dele um menino oceano.

era uma vez um rapaz que sentia bandos de gaivotas a voarem-lhe dentro da cabeça. isso fazia dele um rapaz quase tempestade.

era uma vez um homem que sentia gotas de suor a nascerem-lhe nas palmas das mãos. isso fazia dele um homem homem.
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quero rir-me para dentro da tua boca!

1 comment:

Anonymous said...

"dou-me ao trabalho" de ler as coisas que escreves no teu blog de quando em vez e já por várias alturas me apeteceu tecer considerações (interrogações?) à volta da pessoa que és (agora), ainda que a distância e o desconhecimento dê a qualquer tentativa minha um carácter estupidamente ignorante. não sei quem és (agora), e não é um poema ou um desabafo que me farão conhecer algo mais. não sabes quem sou (arriscaria a dizer que nunca soubeste), e esta tua tentativa, porque ignorante e arriscadamente preconceituosa, cai num saco tão roto, tão roto, que só te respondo porque ainda me preocupo contigo, ao contrário do que possas imaginar. preocupo-me, por exemplo, que sejas assim tão tristemente preocupado com a "propriedade" no discurso de outros, e que busques "gozo" na desconstrução dessa propriedade, à qual não conheces nem contornos nem conteúdos. arrisco a dizer que não percebes absolutamente nada dessa "propriedade", a começar pelo facto de chamares "propriedade" a uma coisa que não o é. confundes trabalho com “discurso sobre” e confundes “discurso sobre” com vida. confundes tudo, na verdade, e deves confundir muitas mais coisas que eu nem me atrevo a tentar definir. entristece-me que depois deste tempo todo, a mágoa ainda te turve o olhar, e que não te permites a ver para lá do superficial. não te desejo (nunca te desejei) mal algum; lá na minha terrinha perdida no meio dos montes, acredita-se muito numa coisa chamada "justiça divina". devias saber. olha para ti, e para essa tua tristeza; se há algum monstro a consumir-te, não serei eu com certeza. és tu próprio, doente por não teres propriedade nenhuma. e acredita, propriedade é coisa que se constrói com trabalho, mas também com muito crescimento 'mental', com muito murro na mesa e muita cabeçada na parede mais próxima. não sabes nada da minha propriedade. porque não sabes (nunca soubeste) quem sou. porque não viste (não quiseste ver) o meu crescimento. e porque a mágoa que te turva o olhar não te deixa ver para lá do teu próprio desconsolo. tudo isto é triste, muito triste. e por isso te sugiro: arranja para ti uma propriedade qualquer, real ou fictícia, e desconstrói-a tu próprio; será com certeza um gozo diferente aquele que irás experimentar! e porque sei que não és propriamente uma pessoa estúpida, não percas tempo a escrever “recados” ignorantes. tens de certeza coisas mais interessantes para dizer.

r.